[Resenha] Garota, interrompida

Autora: Susanna Kaysen

Quando a realidade torna-se brutal demais para uma garota de 18 anos, ela é hospitalizada. O ano é 1967 e a realidade é brutal para muitas pessoas. Mesmo assim poucas são consideradas loucas e trancadas por se recusarem a seguir padrões e encarar a realidade. Susanna Keysen era uma delas. Sua lucidez e percepção do mundo à sua volta era logo que seus pais, amigos e professores não entendiam. E sua vida transformou-se ao colocar os pés pela primeira vez no hospital psiquiátrico McLean, onde, nos dois anos seguintes, Susanna precisou encontrar um novo foco, uma nova interpretação de mundo, um contato com ela mesma. Corpo e mente, em processo de busca, trancada com outras garotas de sua idade. Garotas marcadas pela sociedade, excluídas, consideradas insanas, doentes e descartadas logo no início da vida adulta. Polly, Georgina, Daisy e Lisa. Estão todas ali. O que é sanidade? Garotas interrompidas.

Garota, interrompida é um livro autobiográfico, que rendeu uma adaptação em 1999, a qual infelizmente, nunca assisti. Quando iniciei a leitura e me deparei com uma história real, e da própria autora ainda por cima, foi um choque. Percebi que a trama era muito mais delicada e densa.

A autora nos narra seus quase dois anos em um hospício de uma forma singular. Não há uma linha do tempo definida. Susanna nos conta sua história do jeito que quer, e acha necessário, misturando presente e passado. É através de seu relato que percebemos como pessoas com certo tipo de doença eram tratadas na época (anos 60). Esquizofrênica? Sociopata? Com transtorno de personalidade? Bem, diagnósticos assim eram tratados sempre do mesmo jeito: Jogar em um hospício, drogar os "loucos", dar choque e banhos gelados... Essa era a forma de lidar. É impactante tudo que lemos. Fico feliz que esse campo evoluiu bastante hoje em dia.

Susanna tinha 18 anos quando foi diagnosticada com transtorno de personalidade. É então que seu terapeuta a aconselha a se internar, pois ela é um perigo para si mesma, mas o que eram para ser semanas, viram anos. Ela narra sua vida lá dentro, seu relacionamento com as outras internas, e também seus receios. Nos conta qual o sentimento de querer cometer suicídio, e como é ser alguém assim, explicando que o tempo não é o mesmo que para uma pessoa normal e que nem tudo que sobe, desce.

As colegas de Susanna são o que deixam o livro mais cativante, pois apesar de ser um relato chocante e triste, a leitura não é pesada, pois os diálogos entre elas são bem divertidos. Cada uma delas tenta viver mais um dia com sua loucura. Susanna parece a mais "normal" das internas, mas quando ela nos conta o que está em sua cabeça, vemos que só há tipos diferentes de loucura. Fiquei angustiada com as partes em que a autora conta como é a sensação de querer se matar e o que passa pela cabeça na hora. Ao mesmo tempo fiquei muito triste com sua situação. Garota, interrompida é aquele livro que vai desencadear um misto de emoções no leitor. Depois de terminar de ler, fiquei com uma vontade imensa de assistir o filme!

"Você passou quase dois anos em um hospício! Por que diabos foi parar lá? Não acredito!" Tradução: se você é louca, eu também sou; e como não sou, deve ter havido um equívoco.
"Você passou quase dois anos em um hospício? Qual era o seu problema?" Tradução: preciso saber dos detalhes da sua loucura para ter certeza de que não sou louco.
"Você passou quase dois anos em um hospício? Hummm. E quando foi isso?" Tradução: você ainda é contagiosa?
Parei de contar as pessoas. Não havia vantagem nenhuma em contar.

A trama é tocante, imagina perder dois anos de sua vida? Ainda mais em uma idade que seria para se divertir, namorar... E daí você simplesmente fica presa em um lugar, excluída da sociedade e rotulada de louca... Rótulo este que a segue por boa parte da vida. Enfim, leitura mais que recomendada, acho que todos deveriam conhecer a história dessa mulher que foi tão corajosa ao nos relatar algo tão pessoal e intenso.